domingo, 4 de setembro de 2011

O Alcoólatra

Quando bem jovens só ouvimos histórias e comentários sobre as bebidas. Alguns bons, alguns ruins. Mas quanto mais amadurecemos, a curiosidade aumenta, e as condições ficam mais favoráveis ou liberais para começar a experimentar tal líquido.

Bom, tudo tem um começo e um fim. Já meio mal da cirrose, compartilharei aqui minha trajetória até o alcoolismo, do começo ao meio, porque o fim ainda não aconteceu.
Por que continuo? Mesmo que tenha ganhado uma bela doença, as bebidas podem ensinar muita coisa útil. Tem que gostar e curtir, tomar sincero, para entender o que cada uma tem a ensinar pra você, e por isso que não paro... Cada vez aprendo mais com elas.

Eu não queria começar pesado logo de cara, por isso comecei com os coqueteis. Eram leves, docinhos, e quase não faziam efeito.
Eu gostava, e gostava bastante.
Sempre teve aquele papo de que era bebida de menininha, ou que era pra quem não aguentava. Meus amigos ja bebiam coisas melhores, daí a gozação.
Mas realmente, no fundo eles tinham razão. Era uma bebida fraca, portanto um pouco sem graça, apesar de doce. E não podia misturar com outras, eu estava apenas começando, por isso continuei tomando os coquetéis. Continuei para acompanhar o ritmo de meus amigos, até entrar na monotonia.

Para ser sincero, não mudei muito... O que era vinho agora era pinga, mas no meio de um monte de frutas, coisas doces e tudo mais. Quase uma batida. Quase porque ainda não tinha muita graça, era apenas levemente mais forte.
Era uma bebida mais sociável, podia tomar em público que não seria zombado como se fosse o coquetelzinho. Mas, como já devem imaginar... Não deu outra.
A bebida mudou, mas a situação era quase a mesma. Não chegava à alegria, como costumavam dizer, e eu queria mais.

Enfim, a cerveja! Ahh, essa sim. Como todo moleque, tomava bastante, no começo pra dizer que tomava, mas eu não gostava muito. Demorou um tempinho até começar a gostar de tomá-la, e agora, eu ja acompanhava bem aos outros, mesmo considerando que eles já até tomavam uma vodca ou whisky.
A cerveja. Pra qualquer hora ou lugar, uma bebida ideal, e gostosa. Aliás, ela me deu o 2º porre.

Esqueci-me de lhes contar meu primeiro porre. Na verdade o 1º porre foi duplo, em dois dias seguidos... Resultado da mistura de um monte de coisa alcoólica barata e ruim das quais nem me lembro. Mas foi em uma viagem longe, onde todos bebiam tudo... Apesar de estar sempre atras deles, que já bebiam whisky e ja tinham dado um "Perda Total" eu que inaugurei o porre com bebida barata. Não satisfeito uma vez, fiz duas. Prazer, para os que ainda não me conhecem.

Voltando pra cerveja.

Enquanto a bebia, era muito bom. Ela me fazia sempre alegre, me deixava corajoso e bonito, e de vez em quando voltava correndo pra fora de mim. Bebida ideal. E por não ser muito forte, dava para beber uma cachaçinha, um licorzinho ou um vinhozinho para acompanhar a cerveja. Mas nunca misturava todas, era a cerveja e no máximo mais uma, de cada vez.
Essa era a bebida padrão, totalmente sociável.

Um belo dia resolvi experimentar a temida vodca.
Era forte, realmente... Tanto o gosto quanto a presença. Presença porque em meio ao público não pegava bem. Eu ficaria facilmente mal-visto, por isso só meus amigos sabiam. Não bebia na presença deles nem de ninguem, mas eu gostava de dar umas goladas da malvada, por isso bebia sozinho. Comprei minha própria garrafa.
Nunca deixei de tomar a cerveja, mas às vezes variar com uma destilada era legal. Tomava sempre com moderação. Cheguei muito perto de exagerar na dose. Ainda não havia experimentado um porre forte da vodca... Fiquei frustado por causa disso.

Bem, enquanto estava nesta, estava bom. Tinha experimentado quase de tudo, até whisky eu já tinha bicado, embora não gostasse. Quando de repente:
_"Ei amigo, tome esta aqui!" (referindo-se à tequila.)
Foi amor ao primeiro shot. Forte como vodca, sociavel como a cerveja. Bebida cara.
Quando dei por mim, eu já não tomava mais cerveja, só tequila. O 1º porre dela veio rápido, e não foi único, era toda hora.
Me deixava louco em todos os sentidos, não vivia sem ela. Toda hora era hora para um "shotzin", como diria um de meus amigos.
Enquanto todos na mesa tomavam a cerveja e outras leves, eu já as abandonara.
É lógico que toda essa intensidade foi insana, e foi nesta época que ganhei minha doença.
Não fui para a reabilitação, mas com ajuda de meus amigos e ajuda própria, consegui sair do vício. Era isso, ou a necrose hepatocelular e múltiplos nódulos acabariam de vez com minha saúde, quem sabe até com minha vida. Um resquício de responsabilidade me salvou.

Nenhum vício acaba de uma hora para a outra, por isso voltei um pouco às cachacinhas e vodcas, que não me viciavem mas propiciavam belos momentos, de alegria e descontração. Quase tomei outro porre da vodca... mas depois disso vi que foi melhor assim. Hoje não consigo nem sentir o cheiro dela direito, abdiquei de vez. Estou forte!

As doses foram diminuindo, e eu até achava que me tornaria um "bebo socialmente".
Como já devem imaginar, completamente enganado.
Achei o champagne.

Pode ser engraçado à essa altura, mas depois de tudo que passei, essa sim era ideal. Era docinha e leve.
Meus amigos ainda tomavam cerveja, whisky, cachaça e vodca, e eu já tinha parado. De vez em quando pedia meu champagne para "acompanhá-los".
Mesmo que fosse bebida de mulher e fosse bastante caçoado, eu ja havia passado por bastante problema, e ela era a unica que me deixava tranquilo, em paz, e com aquele gostinho de quero mais depois. Mas estou indo bem devagar, não quero me viciar logo de cara.

Tenho que ir devagar, por isso ficava só no champagne, e só de vez enquanto. Mas os amigos estão sempre aí...
_"Ei amigo, vamos tomar uma diferente desta vez?"
Não sou de recusar convite, fui tomar um martini com ele.
Antes de tomar ele já havia me avisado que era razoavelmente forte, e que eu poderia passar mal se abusasse.
Bom, a verdade é que ela era muito gostosa, gostei de tomar, e queria tomar também um porre, depois de tanto tempo bebendo responsavelmente.
Esta bebidinha não fez mal nenhum, foi só para alegrar o dia mesmo, e nada como beber algo novo na companhia de amigos.

Bem, é o máximo que consigo contar até aqui.
Alguns devem estar se perguntando onde estão as grandes lições que as bebidas me ensinaram.
Se você é um desses, sugiro que releia o texto com mais atenção e criatividade. Se mesmo assim não resolver, eu aceito um convite para um conhaque, do qual não experimentei ainda.
Quanto ao meu futuro? Bem, não adianta perguntar o futuro de um alcoólatra. O que um alcoólatra vai beber, quanto, quando, ou se vai parar de beber, isso acho que só Deus sabe.
Até mais amigos, tenham um belo enquanto tomarei mais um gole de meu champagne.